A PRIMEIRA MONTANHA - MARUMBI 2000

Esse é post antigo e requentado, mas se isso me incomodava até pouco tempo, agora não incomoda mais, pois afinal o que precisa ser quente e imediato são as NOTÍCIAS e não as histórias... uso como exemplo a viagem de SHACKETON que foi em 1914, quase 100 anos atras, e ainda assim leio, releio e acho uma das aventuras mais fantásticas que já aconteceram. Tanto as histórias quanto as pessoas ficam velhas... só que enquanto as pessoas morrem as histórias amadurecem, viram mitos, lendas e épicos. Essa que vem agora é apenas uma caminhada no conjunto MARUMBI, mas que tem de especial o fato de ser A PRIMEIRA MONTANHA DO JOPZ, lá em 2000. O relato ficou anos no site da MATRIXNET e agora vem para o blog de aventuras da BASE1 BRASIL nas palavras originais do explorador BINDER SAM. O nome que ele escolheu foi usado devido aos eventos ECO CHALLENGE, mas depois mudamos o nome para MATRIX MONTANHA. Mantive a cor da MATRIX, só inseri as imagens. E pra fechar a lista de detalhes interessante, 10 anos depois, subi o PICO PARANA junto com o Binder que agora virou meu cumpadre.
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From: Fabio Vinicius Binder 
Date: Mon Mar 27, 2000 
Subject: [matrixnet] Relatorio do Marumbi

Aí matrixnéticos, se alguém não conseguiu ler a mensagem anterior sobre o Marumbi, aqui está ela em formato texto. Desta vez eu fui o encarregado de escrever o relatório da aventura. Não escrevo bem como o Jonatan e nem sou engraçado como ele mas vou me esforçar. Acho que vai ficar um pouco longo, portanto tenham paciência.

Sábado, 27 de março de 2000, 5:40 A.M.
Rua Amazonas, 347 ap. 43B
Curitiba, PR,. Brasil, Terra, Sistema Solar, Via Láctea, Universo.
Introdução: Tudo azul, todo mundo a mil

Nesta primeira aventura oficial da equipe ECO-MATRIX, Kid Fisher Dedé, Jonatan Rookie Didi e eu, Binder Hall Zacarias partimos cheios de esperança para a conquista do Olimpo, o pico mais alto do conjunto Marumbi situado na Serra do Mar. O céu estava limpo, com pouquíssimas nuvens e a viagem foi tranqüila até Porto de Cima, onde demoramos uns 50 minutos para encontrar o sítio do Iberá, local onde passaríamos a noite. De lá fomos de carro até o local onde o pessoal aluga bóias para descer o rio. Deixamos o carro no Oásis, local de confiança do Kid e iniciamos nossa caminhada aproximadamente as 8:05. Caminhamos durante uma hora e meia por uma estrada de terra e pedras de uns 8 km, até chegarmos à estação de Engenheiro Lange. Tivemos que ir a pé porque em certos trechos esta estrada fica bastante irregular, permitindo a passagem de jipes somente. Na estação tivemos a visão da dificuldade que teríamos: o Marumbi estava totalmente coberto por nuvens. Descansamos um pouco e subimos por uma trilha no meio do mato até chegarmos à estação Marumbi uns 20 minutos depois. Fizemos nosso cadastro com o pessoal que cuida do parque (o chefe do local parecia o Peter Potamus), tiramos umas fotos de turista e iniciamos a nossa subida lá pelas 10:15.

Parte 1: Os trapalhões e o segredo da pedra escorregadia:
Qualquer um pode encontrar a trilha para o Olimpo, pois no início é demarcada por placas e durante todo o trajeto por fitas brancas presas em árvores. Se você anda um pouco e não encontra a fita é só voltar para a última bifurcação e mudar o caminho. Jonatan Rookie Didi fez troça da trilha dizendo que era muito fácil, com degraus de pedra e demarcações. Aliás, afirmação bem própria de alguém que tem "Rookie" como nome do meio e Didi como sobrenome. Mal sabia ele o que nos esperava algumas horas adiante. A primeira dificuldade real aconteceu quando chegamos aos rio. Eu não me lembrava do caminho, mas o Kid logo viu uma placa do outro lado. Nesta parte o rio tem muitas pedras o que torna perigosa a sua travessia. Tentamos de um jeito, tentamos de outro e logo estávamos do outro lado sem nenhum incidente. Mais uns 10 minutos de caminhada e encontramos o rio novamente, desta vez bem fácil de se atravessar, deve-se apenas tomar cuidado para andar em cima de uma grande rocha quase escorregadia. Paramos um pouco, nos refrescamos e descansamos. É a partir deste trecho que subida começa e a trilha fica mais difícil. No momento em que recomeçamos a subir (na ordem: eu, Kid e Jonatan) escutei um grito e o barulho de algo pesado caindo na água. Quando olhei para trás vi o Jonatan Didi descendo o rio como se estivesse em um escorregador e o Kid Dedé indo atrás para salvá-lo. Um segundo depois, o Jonatan conseguiu se segurar e o Kid, esquecendo-se que estava sobre uma rocha muito escorregadia levou um tombo digno dos 3 patetas, O Gordo e o Magro, Carlitos e Os Trapalhões: suas duas pernas foram jogadas para o alto e ele caiu com a buzanfa no chão.Em seguida veio a explicação desta cena patética: O Jonatan tentou colocar sua luva e atravessar o rio ao mesmo tempo (puxa, mas que coisa difícil de se fazer!) e o Kid entrou em desespero quando viu-o caindo. Salvos os feridos e enterrados os mortos, continuamos com o nosso objetivo. Mas você se pergunta: onde o Zacarias entra nesta história? Cometeu uma dupla trapalhada: achou que esta fosse a última fonte de água (e não era) e não avisou ninguém para encher os cantis (nem ele mesmo).


Parte 2: Eco-Matrix vai subindo, vem descendo a garoa
A trilha agora ia em apenas uma direção: para cima. Depois de uns 200 metros o Jonatan já se arrependia de ter chamado o caminho de "fácil". Mais uns 30 minutos de caminhada e o Kid começou a sentir uma dor na virilha (mesma dor que ele havia sentido após o último passeio ciclístico) e eu sentia uma forte dor nas pernas e nas costas. Para deixar a situação um pouco mais nebulosa, uma fina garoa caía sobre nós, encharcando nossa roupa e fazendo nossas mochilas ficarem mais pesadas. Este trecho foi completado em quase duas horas, quando chegamos ao primeiro paredão de pedra. Para minha surpresa colocaram "degraus" de ferro neste local, onde antes haviam apenas 2 ou 3 pinos de ferro em locais estratégicos. Mais ou menos as 12:15 alcançamos um paredão vertical (o mais difícil de se subir) onde antes haviam correntes mas agora foram colocados degraus de ferro. Neste paredão havia um aviso de que existia água a nossa esquerda. Paramos para descansar e almoçar. Neste momento notei algo estranho: enquanto eu e o Jonatan conversávamos animadamente e comíamos, o Kid estava quieto, olhando para o infinito, respondendo nossas perguntas com frases curtas e comendo como se aquela fosse sua última refeição. Mais tarde viríamos a descobri que ele estava apavorado com a idéia de subir o paredão.

Parte 3: "Para o alto e avante!"
A partir deste ponto o caminho muda um pouco: Raízes e barro dão lugar a rochedos. Em todos os locais onde antes haviam correntes, foram colocados degraus de ferro. E em um outro lugar onde não havia nada (uma pedra lisa onde o Roika quase nos matou sete anos atrás) foram colocados degraus de ferro e correntes. Para quem sabia como usar as correntes esta não foi uma boa mudança. Explico o motivo: com as correntes era só posicionar seu corpo quase perpendicularmente em relação a pedra e subir como o Batman. Mesmo com a pedra molhada não se escorregava, pois ela é bastante áspera. Agora com os degraus de ferro (alguns não estão na horizontal) é muito fácil deslizar e cair. Para mim que já passei muito medo na primeira vez e aprendi que não se deve pensar sobre o perigo mas apenas continuar subindo como se você estivesse a 1 metro no chão não houve problema. Para o Kid e o Jonatan o negócio foi mais penoso e eu admiro a coragem de ambos por continuarem subindo mesmo sentido um medão danado. Depois de subirmos alguns locais desta maneira chegamos a uma grande rocha que tem que ser contornada: onde antes havia uma grossa raiz envolvendo-a foram colocados 3 degraus de ferro, o que tornou mais difícil a passagem. Segundo o Jonatan este foi o ponto onde ele se sentiu mais inseguro, mas após ser ajudado por mim e pelo Kid, passou sem maiores problemas.

Parte 4: Do alto desta montanha, contemplamos... um baita nevoeiro.
Eram 13:45 (três horas e meia de subida) quando o céu nublado apareceu por completo e alcançamos o cume. Lá não mais encontramos uma cruz de ferro que indicava o ponto mais alto, mas isto não diminuiu o prazer de ter alcançado o objetivo. Lá em cima haviam dois caras com um celular ligando para mãe, pai, namorada, avó e demais familiares. Infelizmente não dava para ver nada pois o cume estava coberto por nuvens e a bela paisagem não pôde ser apreciada. Logo em seguida chegou um camarada sozinho que subiu em duas horas e meia. Seu nome é Paulo Haiduke e tenho duas coisas a destacar sobre ele: virou discípulo do Jonatan e me saiu com a seguinte pérola: "Só volto aqui depois de conseguir desembaraçar o meu cabelo". Como o Jonatan pegou o e-mail dele provavelmente teremos mais um integrante na Matrixnet. Comemos, descansamos, torcemos nossas roupas, tiramos fotos, assinamos o livro do cume e as 14:20 iniciamos nossa descida.


Parte 5: "Para baixo todo santo ajuda". Mas que grande mentira!
A descida foi bastante penosa, pois todos sentíamos fortes dores nas pernas e a garoa apertava. Além disso, as minhas pernas começaram a falsear no início da descida e as do Jonatan mais para o fim. Neste estágio as pernas doem em subidas, doem e falseiam em descidas e ficam quase normais em planos. Como já havia sentido isto outras vezes eu sabia como me portar: descer lentamente, tentando aproveitar o embalo. Com isto eu atrasei a descida por causa do meu estado e agradeço pela paciência de meus companheiros que paravam de tempos em tempos para me esperar. Chegamos à estação as 18:30, demos baixa no cadastro e paramos uma meia hora para nos secarmos e comermos mais uma vez.

Parte 6: Ói, ói o trem... vem surgindo parado lá na estação, ói o trem.
Já era noite fechada e descemos mais uns 15 minutos até Engenheiro Lange e para nossa surpresa lá estava um trem de carga parado, pronto para partir (só não se sabia quando). O Kid já com as funções cerebrais alteradas queria passar pelo meio dos vagões e deixar uma perna ou um braço no engate. O Jonatan sugeriu dar a volta pelo lado da locomotiva que parecia estar mais perto. Só havia um problema: não havia trilha ao lado dos trilhos, teríamos que ir pelo mato, com as plantas atrapalhando nossa passagem de um lado e a locomotiva ameaçando um bronzeamento instantâneo do outro. Acreditando haver apenas uma fomos em frente. Passamos a primeira e havia outra, passamos a segunda e mais outra! Finalmente passamos a terceira e para o outro lado dos trilhos. Fui xingado até a última geração por ter soltado galhos na cara dos outros, mas a situação era crítica, não havia tempo para gentilezas.

Parte 7: AAAAAHHHHHHHHH! I FEEL GOOD!
Após esta "nuisance" botamos o pé na estrada de pedras e terra para voltar ao... Oásis! Mas que nome perfeito para o nosso destino! Com três lanternas, mas apenas uma funcionando 100% conseguimos chegar sem maiores problemas até o local onde o carro estava estacionado. O único acontecimento digno de nota foram os dois ciclistas que encontramos no caminho, andando em direção contrária a nossa e sem farol! Os caras deviam ter radar para conseguir andar naquela escuridão em uma estrada irregular. Mais uns 15 minutos e chegamos ao sítio do nosso querido, gentil, grande ser humano e bondoso Iberá. Tomamos um banho quente (um de cada vez, é claro), comemos o macarrão especial do Jonatan e fomos dormir. Apesar de estarmos com o estômago cheio, todos concordaram que em menos de cinco minutos não havia mais ninguém acordado. Na manhã seguinte, acordei com o barulho do Kid se coçando dentro do saco de dormir. Ele levantou as 6:15, eu as 6:25 e o Jonatan as 6:40. Saímos de lá umas 8:00 e as 9:20 eu já estava em casa. Mas que maravilha!

Conclusão:
O Kid achou melhor retirar o Marumbi do Eco-Chalenge por dois motivos: é muito perigoso e pode assustar alguns possíveis participantes e é muito cansativo para ser feito após pedalar até Porto de Cima. Vamos colocar no lugar o Rochedinho, que está a uns 620 metros de altura. Quanto a mim, parabenizo o Jonatan por ter feito com sucesso a sua estréia no montanhismo e, de acordo com o que ele me falou, vai voltar algum dia para lá (talvez daqui uns 6 meses quando ele se recuperar física e psicologicamente). Acho que agora ele entendeu os relatos dos livros sobre escalada. Parabenizo também o Kid por ter agüentado sua dor na virilha e vencido o seu medo do paredão com os degraus. Ele também me disse que vai voltar, portanto já é um amigo da montanha.

Após esta aventura posso dizer com 100% de certeza que somos uma equipe, pois todos precisaram e ofereceram ajuda quando foi necessário. Lembrei dos Beatles: " I can get HIGH with a little help from my friends." Eu estou quebrado hoje, tive uma dificuldade tremenda para descer os 15 degraus onde eu trabalho mas, mesmo assim acho que vale a pena. Só entende isto quem já subiu uma montanha. Não é um prazer fácil e nem efêmero, mas algo constante que é carregado para sempre junto com você, aumentando nos dias antecedentes a uma subida e chegando ao auge quando você alcança o cume e entra em harmonia com a montanha.
Desculpem a extensão deste texto. Mas tudo o que eu coloquei aqui deve
ficar registrado.

Binder (Paz e amor para todos)
P.S.: Logo, logo teremos as fotos desta aventura.

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